O que significa a mais recente e drástica ação de Trump sobre a Venezuela?

A apreensão de um petroleiro pelo governo Trump na costa da Venezuela é uma das reviravoltas mais dramáticas até agora na campanha de pressão militar contra o ditador venezuelano Nicolás Maduro.

A abordagem de um navio estrangeiro é uma medida incomum e amplia uma operação dos EUA já marcada por ataques contra mais de 20 embarcações no Caribe e no Oceano Pacífico, que o governo alega transportarem traficantes de drogas.

Os primeiros relatos sugerem que a operação da Guarda Costeira dos EUA, com o apoio da Marinha e das forças de segurança, apresenta menos preocupações legais e constitucionais do que a campanha contra as embarcações e as ameaças iminentes de Trump de ação militar em solo venezuelano.

O navio, denominado Skipper, foi apreendido em águas internacionais e transportava petróleo bruto venezuelano, afirmou um alto funcionário americano. Um juiz federal já havia expedido um mandado de apreensão devido a supostos vínculos com grupos terroristas apoiados pelo Irã.

Ainda assim, o entusiasmo de Trump ao anunciar a tomada do navio e a divulgação, pela procuradora-geral Pam Bondi, de um vídeo mostrando militares americanos descendo de rapel de um helicóptero até os conveses do navio ressaltam a importância política do momento.

 

Com seu característico talento para o drama, Trump anunciou à imprensa que os EUA haviam abordado um “grande petroleiro, muito grande, o maior já apreendido, na verdade”.

Embora o petroleiro possa não estar diretamente relacionado ao atual impasse entre Trump e Maduro, sua interceptação será vista no contexto de um enorme aumento da presença naval dos EUA no Caribe, que faz parte de uma aparente tentativa de forçar Maduro a deixar o poder ou de convencer seus subordinados a destituí-lo.

O que está em jogo para Trump e a Venezuela?

Milhões de venezuelanos acolheriam com satisfação a saída de Maduro após anos sombrios sob um regime autoritário que empobreceu o país, impôs repressão e forçou milhões de pessoas a fugir da pobreza e da perseguição.

Assim, a controvérsia em Washington sobre as intenções de Trump na Venezuela não se concentra tanto em saber se a saída de Maduro, após ignorar sua derrota em uma eleição democrática, seria benéfica, mas sim se o presidente americano está agindo dentro da lei.

Os críticos temem que Trump esteja se preparando para envolver os Estados Unidos em mais uma aventura prolongada e desastrosa de política externa, ao buscar novamente exercer poder executivo irrestrito.

As questões legais são mais agudas em relação aos ataques contra supostos traficantes de drogas no Caribe e no Oceano Pacífico, que mataram 87 pessoas.

O governo insiste que está no direito de usar a força militar contra o que classifica como narcoterroristas que ameaçam a segurança nacional americana. Mas a Venezuela não é considerada uma importante rota de tráfico de fentanil para os EUA, como o governo afirma.

E grupos de direitos humanos alertam que os ataques com barcos violam o devido processo legal das vítimas e equivalem a assassinatos sancionados pelo Estado por parte do governo.

Um desses ataques, em 2 de setembro, levou democratas e grupos de direitos humanos a acusarem o governo de crime de guerra, já que envolveu um ataque secundário que, segundo relatos, matou sobreviventes do ataque inicial dos EUA.

Os democratas estão intensificando a campanha para forçar o secretário de Defesa, Pete Hegseth, a entregar ao Congresso o vídeo do ataque. Trump havia dito anteriormente em frente às câmeras que não tinha problemas com tal medida, mas depois negou ter feito o comentário.

A notícia da apreensão do petroleiro e o crescente mistério em torno do ataque duplo surgiram em meio a dúvidas persistentes sobre os objetivos de Trump na Venezuela.

O peso simbólico da enorme força naval americana presente na região, que inclui o porta-aviões mais avançado dos EUA, o USS Gerald R. Ford, significa que qualquer resolução para a crise que não leve à destituição de Maduro seria uma afronta ao poder americano e ao prestígio de Trump.

Barco atacado pelos EUA no Caribe • Donald Trump via Truth Social

Enquanto isso, Trump alertou repetidamente que ataques contra o que ele alega serem locais de tráfico de drogas em terra poderiam começar em breve. Mas, em entrevista ao Politico nesta semana, ele se recusou a discutir estratégia militar e disse de forma vaga que queria que o povo venezuelano fosse bem tratado e “respeitado”.

A CNN noticiou na quarta-feira (10) que o governo Trump estava elaborando planos para o que aconteceria na Venezuela caso Maduro caísse ou deixasse o poder.

Críticos da abordagem de Trump traçaram paralelos com a falha dos EUA em se preparar para a mudança de regime no Iraque em 2003, após a invasão americana. Alguns analistas temem que a Venezuela possa mergulhar na violência e na instabilidade caso o regime de Maduro caia, e que isso possa desencadear uma crise de refugiados. Mas a situação lá tem pouca semelhança com a Bagdá do pós-guerra.

Em outro desenvolvimento que pode aumentar a pressão sobre o regime de Maduro, a líder da oposição venezuelana, María Corina Machado, saiu dramaticamente do esconderijo no país e viajou para Oslo, onde sua filha havia recebido o Prêmio Nobel da Paz em seu nome.

O governo Maduro havia alertado que ela seria considerada uma fugitiva caso deixasse a Venezuela. Mas seu surgimento no exterior também pode apresentar ao governo Trump novas oportunidades para dar destaque à sua causa.

Abordagem de navios é ‘normal’, diz ex-funcionário da inteligência americana

A apreensão do petroleiro Skipper pelos EUA ocorreu com base em um mandado de busca relacionado a atividades anteriores de transporte de petróleo sancionado da Venezuela e do Irã, conforme publicado pela procuradora-geral Pam Bondi no X.

Ela afirmou que o FBI, a HSI (Divisão de Investigações de Segurança Interna) e a Guarda Costeira dos EUA estiveram envolvidos, com o apoio do Departamento de Defesa.

A captura do petroleiro certamente será vista em toda a região como um aviso implícito a outros capitães de petroleiros sobre os riscos de carregar petróleo na Venezuela e operar em suas águas, além de um golpe para a frota clandestina de petroleiros que transportam petróleo sancionado para nações como o Irã.

A Venezuela possui algumas das maiores reservas de petróleo bruto do mundo, e suas vendas ilícitas são uma importante fonte de renda para o regime.

Os governos Trump (primeiro e segundo mandatos) e o governo Biden mantiveram múltiplas camadas de sanções contra o regime de Maduro pela repressão à democracia, inclusive contra a estatal de petróleo e gás natural PDVSA.

O governo em Caracas condenou a apreensão, argumentando que ela expôs a verdadeira motivação da campanha de pressão de Trump.

Logo da PDVSA fotografado em Caracas, Venezuela • REUTERS
Logo da PDVSA fotografado em Caracas, Venezuela • REUTERS

“Não se trata de migração. Não se trata de narcotráfico. Não se trata de democracia. Não se trata de direitos humanos. Sempre se tratou de nossa riqueza natural, nosso petróleo, nossa energia, os recursos que pertencem exclusivamente ao povo venezuelano”, afirmou um comunicado do governo.

Mas Beth Sanner, ex-funcionária sênior da inteligência americana, disse ao âncora Jake Tapper, da CNN, que a apreensão de um petroleiro venezuelano era “absolutamente normal”, como parte de uma tentativa de impedir o regime de transportar petróleo sancionado.

“No passado, todos queriam apreender esse tipo de petroleiro, mas não tínhamos os recursos na região para fazê-lo”, disse Sanner.

Os democratas no Capitólio não estão dispostos a aceitar qualquer ação relacionada à Venezuela pelo seu valor real.

Questionada pela CNN se os EUA estavam agora mais perto de uma guerra com a Venezuela, a deputada Chrissy Houlahan, membro da Comissão de Serviços Armados da Câmara, disse: “Como poderíamos não estar mais perto quando estamos fazendo homens e mulheres de nossas forças armadas descerem de helicópteros e atacarem aviões-tanque civis que ostentam a bandeira de outra nação? É definitivamente uma escalada; não há outra maneira de dizer isso.”

Ela acrescentou que, se o objetivo de Trump era a mudança de regime por meio da força militar, ele era constitucionalmente obrigado a obter uma autorização do Congresso — embora ela acreditasse que tal medida não fosse do interesse dos EUA.

Enquanto isso, o líder da minoria no Senado, Chuck Schumer, disse a Jake Tapper no programa “The Lead” que a retórica de Trump era tão confusa que era impossível saber quais eram suas verdadeiras intenções.

“O presidente Trump fala tantas coisas diferentes, de tantas maneiras diferentes, que você não sabe do que diabos ele está falando”, disse Schumer.

“Se Maduro simplesmente fugisse por conta própria, todos gostariam disso.” Mas Schumer acrescentou: “Você não pode dizer ‘Eu apoio isso, eu apoio aquilo’ quando Trump está falando de tudo um pouco.”

Como em grande parte do segundo mandato de Trump, há pouca transparência pública sobre os objetivos do presidente, que muitas vezes parecem depender de seus caprichos pessoais.

Trump preza pela imprevisibilidade.

O presidente dos EUA, Donald Trump • Reprodução CNN Brasil
O presidente dos EUA, Donald Trump • Reprodução CNN Brasil

Por isso, ele não fez nenhuma tentativa de explicar aos americanos por que tantos militares estão em navios na costa da Venezuela ou o que esse caro destacamento supostamente pretende alcançar.

Se o presidente conseguisse depor Maduro e conduzir a Venezuela à democracia, poderia reivindicar uma vitória política significativa.

Também consolidaria seu objetivo de exercer o poder americano em todo o Hemisfério Ocidental, uma aspiração coerente com sua recém-divulgada Estratégia de Segurança Nacional.

Isso parece ser tanto uma tentativa de remodelar a América Latina à sua própria imagem, alinhada ao movimento MAGA, quanto uma estratégia americana mais tradicional para conter a influência chinesa e russa na região.

Mas a história mostra que, mesmo em circunstâncias extremas, regimes ditatoriais construídos ao longo de décadas costumam ser mais duradouros do que os observadores externos acreditam.

O governo venezuelano tem sido comparado a uma complexa organização criminosa — com membros-chave tendo enormes interesses financeiros na perpetuação do próprio poder. E embora muitos esperem que a pressão de Trump leve à ascensão dos legítimos governantes democráticos do país, nada é certo.

Mas a apreensão do petroleiro aumentou ainda mais a pressão sobre Maduro. E levou Trump ainda mais adiante no que começa a parecer um caminho inexorável para um confronto, no qual ele está investindo enorme credibilidade pessoal.

Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br

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