O engenheiro eletrotécnico Ricardo Salada escolheu um caminho distinto das redes elétricas, preferindo a rotina agitada das investigações criminais na cidade de São Paulo. Salada ingressou no Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), em 1993, como perito criminal.
Após a recente aposentadoria, Salada decidiu contar bastidores dos mais de 30 anos que passou na Polícia Civil de São Paulo. O perito atuou em casos de repercussão nacional, como “Maníaco do Parque” e “Suzane von Richthofen”.
Salada também fez a perícia de um crime que chocou o país, o assassinato do empresário da Yoki, Marcos Kitano Matsunaga, que foi executado e esquartejado pela então companheira Elize Matsunaga, em 2012.
Assim como nos filmes, detalhes quase despercebidos aos olhos menos experientes, passam a ser cruciais na investigação de casos como esses. Quando pedaços do corpo do empresário foram espalhados por São Paulo, uma peça de roupa chamou atenção sobre o perfil da vítima que supostamente estava viajando, já que Elize enviava mensagens falsas, se passando pelo empresário.
“A cueca que estava vestida na parte do corpo encontrada era um artigo de luxo, de uma marca famosa. Mais de 90% dos homens não vão comprar um item tão caro. Por essa peça de roupa notamos que essa vítima parecia ter um poder aquisitivo maior e assim começar a identificar que se tratava do empresário da Yoki”, diz Ricardo Salada em entrevista à CNN.
Dificuldades da investigação
Para o investigador forense, cada cena de crime é rica em detalhes, mas o ambiente enfrenta dificuldades diferentes para que o caso possa ser solucionado.
“Na grande maioria dos locais em via pública, você tem menos vestígios. O que é o menos vestígio? Você dá um disparo, se você está na via pública, o projétil pode se perder, some. A gente não sabe onde vai parar, desaparece, não tem como achar”, afirma Salada.
Os curiosos de plantão também podem atrapalhar a cena de um homicídio, principalmente na coleta de evidências e projéteis. “Você ainda tem a situação quando junta a população: ‘olha que bonito, vou levar de lembrança’. Às vezes você tem uma mancha de sangue, mas até chegar a equipe de investigação e a polícia militar isolar o local, o pessoal já pisou em cima”.
O profissional também conta como funciona o dia a dia do perito criminal ao ingressar no DHPP.
“Houve um crime, chama o 190, aí vai a Polícia Militar. Se tem uma vítima, os policiais acionam o Samu para socorrer ou atestar se está morto. Aí ele avisa o delegado, que vai ao local para fazer uma investigação prévia. Sabe quem matou? Não. Então, autoria desconhecida. Aí eles vão voltar para a base e vão mandar uma mensagem para os centros de comunicações do DHPP, assim acionam a equipe de investigação, incluindo o perito”, conclui Salada.
O perito ainda detalha o trabalho, como por exemplo, de situações similares ao assassinato do ex-delegado-geral da Polícia Civil, Ruy Ferraz Fontes. “O perito criminal faz o exame do local analisando os veículos, levantando impressões digitais e , se possível, material para exame de DNA. Análise da posição dos bancos, que pode estimar a altura do condutor ou passageiros, além de verificar algum dano no veículo que possa ser analisado'”, afirma.
Evolução do trabalho
Quando Salada iniciou na polícia, ainda nos anos 90, outras tecnologias eram aplicadas, a coleta de DNA só foi implementada pela primeira vez apenas em 1994, pelo Distrito Federal, começando o inédito laboratório forense deste tipo no Brasil. Antigamente, quando se analisava o sangue nos crimes, a única coisa que dava para atestar era a tipagem, sem muita utilidade, sem definição.
A chegada do ‘luminol’, substância que não existia no país no começo de carreira do Salada, ajudou no aperfeiçoamento das investigações policiais brasileiras. “O luminol identifica a provável mancha de sangue, assim eu tenho um teste monocromático que me dá o resultado na hora, se for sangue e se é humano. Então, dependendo da investigação, só de saber que é sangue, me dá um ganho monstruoso na cena do crime”, analisa o perito.
Na cena do crime
O livro “Na cena do crime: por trás da fita amarela”, escrito por Ricardo Salada, que conta os bastidores do trabalho do perito, tem previsão de lançamento para o dia 13 de outubro, pela editora Principis.
Após se aposentar, o autor trabalha como perito particular, além de realizar mentorias para novos profissionais que queiram ingressar em carreiras periciais e participar do programa televisivo Perícia Lab.
Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br